sábado, 13 de setembro de 2008

Manifesto do Ateísmo Cósmico

“Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”
(Caetano Velozo)

"E para início, tomaremos como base que não há coisa alguma que tenha jamais surgido do nada por qualquer ação divina." (Lucrécio)

"Deus, ou quer impedir os males e não pode, ou pode e não quer, ou não quer nem pode. Se quer e não pode, é impotente: o que é impossível em Deus. Se pode e não quer, é invejoso: o que, do mesmo modo, é contrário a Deus. Se nem quer nem pode, é invejoso e impotente: portanto nem sequer é Deus. Se pode e quer, o que é uma coisa compatível com Deus, donde provém então a existência dos males? Por que razão é que os não impede?"(Epicuro)

"Ó raça humana tão infeliz por ter atribuído tais fatos aos deuses e por lhes ter juntado as cóleras acerbas! Quantos lamentos para si próprios, quantas feridas para nós, quantas lágrimas para os nossos descendentes não originaram eles!" (Lucrécio)

"O céu nós deixaremos para os anjos e os pardais.
Queremos ser felizes na Terra”( H. Heine )

“Os homens do primado espiritual viviam bem, cuidavam do corpo, mas nós, desgraçados materialistas, alojados em quartos de pensão, como ratos em tocas, a pão e laranja, como se diz na minha terra, quase nos reduzíamos a simples espíritos”(Graciliano Ramos)
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“Essa pressa leviana
demonstra o incompetente.
Por que fazer o mundo em sete dias
se tinha a eternidade pela frente?”
(Millor Fernandes)

“Vi uma mão fazer no barro
um homem forte, um homem nu
um homem branco como eu
um homem preto como tu
porém não foi a mão de Deus
foi Vitalino de Caruaru”
(Bráulio Tavares)

“Não se é apenas religioso quando se adora uma divindade, mas sim quando se empregam todos os recursos do espírito, todas as submissões da vontade, todos os ardores do fanatismo, ao serviço duma causa ou dum ser que se faz alvo e guia dos nossos pensamentos e atos”
(Gustavo Le Bom)


O Manifesto

1 - Há uma incompatibilidade política fundamental entre a idéia da divindade e o segmento dos ateus cósmicos. Somos plebeus e republicanos, enquanto os propagandistas do Altíssimo, pelo menos nestas bandas ocidentais do planeta, pregam o Reino de Deus. E se já nos desagradam os saibros imperiais presentes na república atual, ilhada de núcleos aristocráticos e séquitos de cortesãos comissionados, imaginem aceitarmos uma monarquia absoluta comandada por um Rei-Deus todo-poderoso.

2 - Otro agravante é que Sua Majestade Divina exerce um poder absoluto unipessoal
vitalício e eterno, sem dinastia nem sucessores. E nós, como republicanos, já nos consideramos saturados com uma única reeleição para cargos executivos.

3 - Considera-se um tanto antiquada a estruturação dos poderes no esquema montesquieuriano de executivo, legislativo e judiciário. Surgem as instâncias colegiadas, os ouvidores, os ombudsmans, os plebiscitos, os referendos e as iniciativas de lei a partir de sobrescrições de eleitores, como formas de participação representativa. Mas aí se coloca Sua Majestade Divina como encarnação suprema de todos os poderes, concentrando as funções executiva, legislativa e judiciária e vetando o acesso da sociedade civil e militar, servil e inservil, às suas instâncias absolutas e ocultas. Ela dita as leis, aplica os códigos e administra as coisas transparentes e ocultas, constrangendo, mais uma vez, o sentimento republicano dos cidadãos em geral, e não só dos ateus.

4 - Sua Majestade Divina é uma autoridade de difícil acesso, pois não dá audiência a pessoas ou grupos, nem aceita nenhuma forma de diálogo direto com os seus súditos.

5 - No tocante à delegação de atribuições, o caos é completo, pois uma infinidade de instituições e indivíduos se arroga como detentora da condição de representantes oficiais e disputam entre si a titularidade divina, sujeitando os súditos a uma guerra de propaganda e catequese com tiroteios cada vez mais invasivos e gulosos.

6 - Não nos agrada o desempenho de Sua Majestade Divina no exercício do poder absoluto. Sendo onisciente, poderia ela ter evitado uma infinidade de males do mundo. Mas deixa-os se desenvolverem e peca, neste ponto, como contumaz reincidente em matéria de omissão de autoridade e de socorro. Sendo onipotente, sua culpa generalizada se agrava, levando-a, constantemente, a ser enquadrada em crimes de responsabilidade. Isto, se consideramos que todos os seus propalados poderes são reais. Se não forem, estaremos diante de um caso evidente de propaganda enganosa. Aí, Sua Majestade Divina se enquadra como infratora do Código de Defesa do Consumidor.

7 – Pelo expediente da onipresença Sua Majestade Divina pode estar ao mesmo tempo em todos os lugares, o que caracteriza uma intolerável invasão de privacidade, agredindo direitos civis muito caros nos tempos atuais. Nisto, Sua Majestade Divina supera a CIA, a KGB e todas as agências de espionagem do passado e do presente.

8 - Os propagandistas de Sua Majestade Divina o colocam no papel de pastor, enquanto nós, os seres humanos, somos relegados à condição de ovelhas do seu rebanho. Semelhante representação nos desqualifica no estágio a que chegamos na evolução das espécies. No terreno político, caracteriza uma estrutura de poder pré-patriarcal, pré-caudilhesca e pré-retrógrada. Indagamos se não derivam daí as idéias do "curral eleitoral" e da vanguarda como detentora das "rédeas", sendo o povo a cavalgadura, sujeita a sela e esporas.

9 - Conhecedores e padecedores da condição de ateus numa sociedade onde predomina a hipocrisia religiosa, acostumamo-nos a conviver com a realidade de todas as seitas. E inspirados no ensinamento do companheiro Jota Cristo, segundo o livro autorizado, aprendemos a perdoar, 70 x 7 as grosserias, injúrias, calúnias e difamações lançadas contra nós por espíritos primários, porque, afinal de contas, "eles não sabem o que dizem".

[Seguem-se 11 itens]

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